Rezamento
4
A Menina juntava pedacinhos de sabão: amarelos, alaranjados,
verdes, azuis.
Acocorada a beira do
riacho, esfregava sabão nas roupas. Esfregava a roupa contra os dedos. Enxaguava.
Batia a roupa contra o
lajeiro, torcia.
Acontecia de passar o
sabão na roupa e um dedo escapar, relar no lajeiro, sangrar.
A Menina mergulhava o
dedo na água e a correnteza levava o sangue. A filepinha de sangue, cobrinha de
sangue, de nada.
A Vó ficava dentro de
casa, entrevada. Ela e o escuro da casa. Acendia velas grossas e encomendava as
almas doentes.
Com um tempo a Vó
abria a janela. A luz doía na vista. Os olhos fechados abriam-se devagar,
acostumando se ao clarão.
Lá em baixo, a vista
da velha mirando, estava à Menina, a neta.
Pequenina, magrinha
magrinha. Pele e osso, a Vó dizia. Dia desses a gente chega num doutor,
pergunta, pega receita e minha filha cresce, minha filha encorpa, fica maior
que eu, maior que a Vó e as almas.